A Empresa B possuía originalmente a concessão dum terreno de uso industrial, designado por lotes U2, U4 e U5. Em 2006, o Governo decidiu trocar o referido terreno por um outro terreno designado por CN2c, e negociou com a Empresa B sobre os termos do contrato. A seguir, a Empresa B apresentou a declaração de aceitação, a cópia da guia de pagamento do prémio e o certificado da caução. Em 2013, A ficou interessado no aludido terreno CN2c e marcou um encontro com C, um dos administradores da Empresa B, que por sua vez, disse a A que a Empresa B possuía os direitos e interesses resultantes da concessão do terreno CN2c, tinha celebrado um contrato de concessão com o Governo, bem como tinha pagado o prémio e apresentado a garantia bancária, e aguardava a publicação do respectivo despacho no Boletim Oficial da RAEM. C também forneceu a A os documentos relativos ao plano do Governo de concessão do terreno em 2006. Posteriormente, A celebrou um acordo de compromisso com C, concordando em obter os direitos e interesses resultantes da concessão do terreno CN2c mediante a aquisição, em prestações, de 100% das acções da Empresa B. No mesmo ano, A e C assinaram um contrato de transmissão de acções, pelo qual A pagou a C um preço de HKD372.000.000. Após a celebração do contrato de transmissão de acções, o advogado de A dirigiu-se à então DSSOPT para consultar o processo e descobriu que a Empresa B nunca obtivera os direitos e interesses resultantes da concessão do terreno CN2c, e que o respectivo processo de concessão do terreno já tinha sido suspenso. A sentiu-se enganado, pelo que denunciou o caso. Realizada a investigação, o MP deduziu acusação contra C. Após o julgamento, o Tribunal Judicial de Base absolveu C da imputada prática dum “crime de burla”, p. p. pelo art.º 211.º, n.º 4, al. a) do CPM, indeferindo ao mesmo tempo o pedido de indemnização civil, formulado por A contra C.
A, como assistente, não se conformou com o decidido, e recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, entendendo que o TJB errara notoriamente na apreciação da prova.
Após conhecimento, o Tribunal Colectivo do TSI julgou improcedente o recurso, mantendo a decisão do Tribunal a quo.
Ainda inconformado, A interpôs recurso da referida decisão na parte relativa à indemnização civil, para o Tribunal de Última Instância. C deu a sua resposta ao recurso, entendendo que havia litigância de má-fé por parte de A.
O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso. Quanto à questão de erro notório na apreciação da prova, na óptica do Tribunal Colectivo, acertada se mostra a análise objectiva, plena e detalhada dos elementos de prova constantes dos autos e das provas produzidas em audiência, feita pelo TSI, e a conclusão a que este chegou. Atentos os elementos constantes dos autos, a situação da troca do terreno CN2c pelo terreno U2, U4 e U5 correspondeu basicamente ao conteúdo descrito no acordo de compromisso assinado por A e C. Embora C tivesse declarado, na qualidade do representante da Empresa B, que esta possuía todos os direitos e interesses resultantes da concessão do terreno CN2c, também afirmou na sua declaração que aguardava a publicação do respectivo despacho de concessão no Boletim Oficial da RAEM. A primeira declaração de C não correspondia à verdade do ponto de vista legal, mas a última declaração dele, e os outros conteúdos da sua declaração correspondiam à verdade, reflectindo a situação de facto em que se encontrava a mencionada concessão do terreno. Quanto ao facto de C não ter informado A da proposta feita pelo Governo na reunião, no sentido de substituir o terreno CN2c pelo lote D1 na troca dos terrenos, considerando que C rejeitou tal proposta, e o Governo não deu seguimento ao caso, não resta dúvida que C ainda tinha a expectativa razoável de obter a concessão do terreno CN2c. Com base nos depoimentos das testemunhas da então DSSOPT, após a aludida reunião, ninguém tinha a certeza se o terreno CN2c não seria concedido à Empresa B. Em Maio de 2014, a então DSSOPT ainda enviou um ofício à Empresa B informando-a que não concretizava o procedimento de troca do terreno CN2c pelo terreno U2, U4 e U5. Daí se constata que a situação do terreno CN2c não sofreu nenhuma alteração material, não podendo a falta de informação por parte de C ser qualificada como provocação, dolosa e astuciosa, de engano.
Relativamente à questão de litigância de má-fé, indicou o Colectivo que, estando em causa um valor extremamente elevado, é compreensível que A recorresse a todos os meios processuais para defender os seus direitos e interesses. Embora A tivesse insistido na interposição do recurso para o TUI, que viria a ser julgado improcedente, não se poderia tirar a conclusão de que A tivesse agido com dolo ou negligência grave, e, sabendo bem da falta de fundamento, ainda tivesse praticado acto processual de modo manifestamente reprovável, com o fim de conseguir o objectivo dilatório, imputado por C. As condutas de A não ultrapassavam manifestamente o âmbito do exercício do seu direito ao recurso.
Pelo exposto, acordaram no Tribunal Colectivo do TUI em negar provimento ao recurso, indeferindo o pedido de condenação do recorrente como litigante de má-fé, formulado pelo recorrido.
Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância no Processo n.º 50/2023.