A e B são advogadas estagiárias que frequentavam as aulas do módulo de Direito Administrativo, da componente escolar do estágio. No dia 5 de Setembro de 2018, no Centro de Formação Jurídica e Judiciária (CFJJ) de Macau e com início às 09h30, teve lugar uma aula respeitante ao referido módulo, e B, estando atrasada na chegada ao CFJJ para frequentar a referida aula, contactou A por telemóvel, pedindo-lhe que assinasse o seu nome no respectivo lugar da folha de presença. Acedendo ao pedido, A, após assinar a própria presença na referida folha, assinou, com o seu próprio punho, o nome de B na mencionada folha de presença. Ao actuarem do modo descrito, A e B, em conluio, procuraram enganar os responsáveis do CFJJ relativamente à presença atempada da participante B na referida aula.
O Conselho Superior da Advocacia tomou deliberação, decidindo aplicar a A e B a pena disciplinar de advertência nos termos do artigo 41.º, n.º 1, al. a) do Código Disciplinar dos Advogados.
Inconformada com a deliberação, a Associação dos Advogados de Macau interpôs ao Tribunal de Segunda Instância (TSI) recurso contencioso de anulação do acto, por entender que a pena aplicada é leve.
No entender do TSI, B agiu com dolo directo, foi ela quem instigou A a incorrer na prática da respectiva infracção disciplinar, e o grau de culpa é manifestamente mais intenso em relação ao de A, pelo que a pena disciplinar de advertência aplicada a B é manifestamente leve e desproporcional. Face ao exposto, o Tribunal Colectivo do TSI acordou em julgar parcialmente procedente o recurso contencioso interposto pela Associação dos Advogados de Macau, anulando, em consequência, o acto administrativo impugnado, na parte referente à escolha da pena a aplicar a B.
Inconformada, B recorreu para o Tribunal de Última Instância (TUI).
Apreciado a causa, o TUI apontou o seguinte: É a jurisprudência firme deste Tribunal de Última Instância que a aplicação pela Administração de penas disciplinares, dentro das espécies e molduras legais, é, em princípio, insindicável contenciosamente, salvo nos casos de erro manifesto, notória injustiça ou violação dos princípios gerais do Direito Administrativo como os da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade. Por outra palavra, a intervenção do juiz fica reservada aos casos de erro grosseiro, ou seja, àquelas situações em que se verifica uma notória injustiça ou uma desproporção manifesta entre a sanção infligida e a falta cometida pelo agente.
Nos casos em que a Administração actua no âmbito do poder discricionário, não estando em causa matéria a resolver por decisão vinculada, a decisão tomada pela Administração fica fora de controlo jurisdicional, salvo nos casos excepcionais acima referidos.
Referiu ainda o TUI que, há que pôr em confronto os bens, interesses ou valores perseguidos com o acto administrativo restritivo ou limitativo e os bens e interesses individuais sacrificados por esse acto, para aferir da proporcionalidade da medida concretamente aplicada. E só no caso de considerar inaceitável e intolerável o sacrifício é que se deve concluir pela violação dos princípios orientadores do exercício de poderes discricionários, tais como da proporcionalidade, da razoabilidade e da justiça.
Nesta causa, o TUI não verificou erro manifesto ou grosseiro na decisão do Conselho Superior da Advocacia que aplicou a pena disciplinar de advertência às duas advogadas estagiárias, nem entendeu que a sanção disciplinar é desproporcional.
Pelo exposto, o TUI concedeu provimento ao recurso jurisdicional, revogando o acórdão recorrido.
Cfr. Acórdão proferido no processo n.º 110/2021 do Tribunal de Última Instância.