Em articulação com a medida sanitária preventiva adoptada pelo Governo, C forneceu as gravações de vídeo feitas pela câmara de vigilância por ela instalada na entrada da sua casa à autoridade policial para fins de investigação do controlo de pessoas sujeitas à medida de quarentena domiciliar. A e B que habitavam no mesmo edifício, ficaram insatisfeitos com a sobredita conduta de C, considerando que C podia, através da câmara de vigilância com função de gravação de áudio e vídeo por ela instalada na escada comum do edifício em que morava, monitorizar todas as pessoas que usavam a escada de acesso à sua residência, pelo que apresentaram queixa ao Ministério Público, na qual a acusaram de observação e escuta às ocultas dos ora queixosos sem consentimento expresso ou tácito deles, violando o direito à imagem destes, conduta essa que constituiu o crime de devassa da vida privada e o crime de gravações e fotografias ilícitas, previstos nos artigos 186.º, n.º 1, e 191.º, n.º 2, al. b) do Código Penal de Macau, respectivamente. Finda a instrução, o Juiz do Juízo de Instrução Criminal entendeu que a conduta de C não constituía os crimes em apreço, decidindo não pronunciar C. Inconformados, A e B recorreram do despacho de não-pronúncia para o Tribunal de Segunda Instância, por entenderem que o Juiz do JIC cometeu erro de aplicação do Direito e erro de apreciação da prova.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.
Depois de vistos todos os elementos probatórios dos autos, entendeu o Tribunal Colectivo que não era patentemente desrazoável o resultado do julgamento da matéria de facto a que chegou o JIC. No entendimento de A e B, C praticou o crime de devassa da vida privada, por ter instalado a câmara de vigilância na escada do edifício. Quanto a esta questão, entendeu o Tribunal Colectivo que a escada do edifício habitacional não é um lugar privado de A e B, mas sim uma via de acesso destinada ao trânsito de pessoas dentro do mesmo edifício, pelo que não se verificou a prática, por C, do crime de devassa da vida privada, previsto no art.º 186.º, n.º 1 do Código Penal de Macau, a ela assacado por A e B. Ademais, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 3.º da Lei n.º 8/2005, a instalação da câmara de vigilância por C na escada do seu edifício para fins de segurança e o tratamento do conteúdo da respectiva gravação não precisavam de ser autorizados pelo Gabinete para a Protecção de Dados Pessoais. Além disso, nos termos do disposto nos n.ºs 2 e 5 do art.º 80.º do Código Civil de Macau, e conforme a eficácia do n.º 1 do art.º 30.º do Código Penal de Macau, a gravação feita por C também não carecia do consentimento das pessoas abrangidas pela gravação. No que concerne ao fornecimento, por C, do conteúdo da gravação à autoridade policial, assinalou o Tribunal Colectivo que, nos termos do art.º 6.º, al. 2) da Lei n.º 8/2005 e do art.º 30.º, n.ºs 1 e 2, al. c) do Código Penal de Macau, tal conduta de C também não constituiu o crime de gravações e fotografias ilícitas, previsto no art.º 191.º, n.º 2, al. b) do Código Penal de Macau.
Destarte, acordaram no Tribunal Colectivo em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão de não-pronúncia.