A, sendo membro duma determinada associação criminosa que se dedica à burla e ao branqueamento de capitais, veio a Macau para criar a sociedade B a pedido da referida associação, bem como abriu várias contas bancárias em Macau em nome da sociedade. Com efeito, a sociedade B é uma empresa fantasma, cuja finalidade consiste em abrir contas bancárias destinadas à recepção dos benefícios ilícitos emergentes de crime, com vista a dissimular as origens ilícitas de fundos e ocultar a verdadeira identidade dos titulares desses fundos. Posteriormente, a associação criminosa em apreço burlou com êxito a sociedade C, levando a aludida sociedade a transferir o montante de USD101.087,00 para a conta bancária aberta pela sociedade B em Macau. A seguir, A transferiu integralmente a quantia em causa para a conta bancária aberta em Macau pela sociedade E, detida por D, e, por seu turno, D levantou em numerário e transferiu a referida quantia. Realizado o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A, pela prática em co-autoria material e na forma consumada de um “crime de associação criminosa”, p. e p. pelo art.º 288.º, n.ºs 2 e 1 do Código Penal, e de um “crime de branqueamento de capitais”, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, em conjugação com o art.º 4.º, alínea 1), ambos da Lei n.º 2/2006 (Prevenção e repressão do crime de branqueamento de capitais), nas penas de 3 anos e 6 meses, e 4 anos de prisão, respectivamente, e, em cúmulo jurídico, foi o mesmo condenado na pena de 5 anos e 6 meses de prisão.
Inconformado, A interpôs recurso para o Tribunal de Segunda Instância que negou provimento ao recurso, sustentando a decisão a quo.
Ainda inconformado, A recorreu para o Tribunal de Última Instância da decisão que o condenou pelo cometimento do crime de branqueamento de capitais.
O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso. Apontou A que um dos seus parceiros apenas foi condenado num outro processo pela prática do crime de receptação, p. e p. pelo art.º 227.º, n.º 1 do Código Penal, pelo que invocou A que ele próprio deveria ser condenado pelo crime de receptação e não pelo crime de branqueamento de capitais. Face a isto, entendeu o Tribunal Colectivo que a condenação do parceiro criminoso de A noutro processo era irrelevante para o julgamento deste recurso. O essencial é saber se, conforme os factos dados como provados, A reúne ou não os elementos constitutivos do crime de branqueamento de capitais. Uma das diferenças fundamentais entre o crime de branqueamento de capitais e o crime de receptação é que, quanto ao crime de branqueamento de capitais, o agente pratica o acto ilícito constitutivo desse crime “com o fim de dissimular a sua origem ilícita ou de evitar que o autor ou participante dos crimes que lhes deram origem seja penalmente perseguido ou submetido a uma reacção penal”; por outras palavras, a lei exige que o agente tenha o desígnio criminoso especial, ou seja, “branquear” os fundos de origem ilícita. No caso vertente, os factos dados como provados pelo Tribunal revelam, indubitavelmente, o elemento constitutivo subjectivo supramencionado, isto é, A recebeu e transferiu os benefícios ilícitos através das contas bancárias por ele abertas, sendo evidentemente um método de transferência de benefícios ilícitos através da operação de instituições bancárias; a par disso, é também ostensivo o acto de ocultar a natureza e a origem dos fundos ilegais praticado por A.
Nos termos e fundamentos que se deixaram expostos, em conferência, acordaram em negar provimento ao recurso interposto por A, mantendo-se o Acórdão recorrido.
Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Última Instância no processo n.º 62/2023.