Em 10 de Outubro de 2021, à noite, uma trabalhadora dum supermercado sito em Macau, na Estrada dos Cavaleiros, confrontou A e B que entraram no supermercado sem máscaras, por isso, pediu-lhes que usassem máscaras e exibissem os “Códigos de Saúde”. Como resultado, A e B entraram em disputa com a operadora da caixa C. A, por estar insatisfeito com a atitude de C, pegou e bateu no telemóvel de C que se encontrava colocado em cima da mesa. Reparando na situação, C pegou de volta no seu telemóvel, usando-o para bater em A. Consequentemente, A revidou contra C. A seguir, um outro trabalhador do supermercado D separou imediatamente A e C, bem como tentou mediar a situação. A empurrou para o chão uma caixa de cartolina colocada em cima da mesa da caixa de pagamento, a fim de expressar a sua insatisfação, o que causou danos às mercadorias. A, ao sair do supermercado, foi parado por D. C entrou novamente em conflito com A devido aos danos causados às mercadorias. À altura, B e A atacaram, em conjugação de esforços e por várias vezes, C com socos e com a cadeira metálica que estava ao lado da mesa da caixa de pagamento. Quando B saiu do supermercado, C seguiu atrás dele até ao exterior do supermercado e impediu que o mesmo abandonasse o local. Visando abandonar o referido local, B agrediu várias vezes e com socos na cabeça e puxou os cabelos dela, por fim, C ficou deitada no chão. Posteriormente, os guardas do Corpo de Polícia de Segurança Pública que chegaram ao local em causa, interceptaram A e B no exterior do supermercado.
Findo o julgamento, o Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base condenou A, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa qualificada à integridade física, p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1, em conjugação com os artigos 140.º, n.ºs 1 e 2, e 129.º, n.º 2, al. c), todos do Código Penal, na pena de 2 anos e 10 meses de prisão; pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de dano, p. e p. pelo art.º 206.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 4 meses de prisão; em cúmulo jurídico, A foi condenado na pena de 3 anos de prisão efectiva; e condenou B, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa qualificada à integridade física, p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1, em conjugação com os artigos 140.º, n.ºs 1 e 2, e 129.º, n.º 2, al. c), todos do Código Penal, na pena de 3 anos e 3 meses de prisão efectiva. A e B foram absolvidos da prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de armas proibidas, p. e p. pelo art.º 262.º, n.º 3 do Código Penal, que lhes tinha sido imputado.
Inconformados, A e B recorreram do decidido para o Tribunal de Segunda Instância.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso, entendendo que, in casu, à luz dos factos provados, à altura, todas as pessoas da sociedade estavam a prevenir-se conjuntamente contra a pandemia e o Governo exigia que todas as pessoas usassem máscaras e exibissem os “Códigos de Saúde”, sendo este um assunto sério. A e B recusaram-se a cumprir as exigências do Governo e, por esta razão, entraram em conflito com C, bem como atacaram, em conjugação de esforços, C depois do ataque feito pela mesma. Assim, pode-se dizer que existe certa “razoabilidade” entre a conduta e o motivo de A e B, razoabilidade essa não significa que a conduta deles seja lícita ou incensurável, mas sim os cidadãos em geral entendem que existe um nexo de causalidade socialmente compreensível entre a conduta e o motivo deles, isto é, tal conduta não foi fortemente censurada pela sociedade. Deste modo, no entendimento deste Tribunal, a conduta de A e B não revela as circunstâncias especialmente censuráveis ou perversas previstas na alínea c) do n.º 2 do art.º 129.º do Código Penal – “ser determinado por avidez, pelo prazer de matar ou por qualquer motivo torpe ou fútil”, mas sim reúne os requisitos do crime de ofensa simples à integridade física, p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1 do Código Penal. Nesta conformidade, procedeu o recurso interposto por A e, nos termos do disposto no art.º 392.º do Código de Processo Penal, a decisão proferida no recurso interposto por A aproveitou a B.
Além do mais, conforme o Tribunal Colectivo, antes da audiência de julgamento, B fez o depósito do montante de MOP20.000,00 como parte da indemnização, porém, essa quantia correspondia a uma parte diminuta dos prejuízos causados a C pela conduta do mesmo. As circunstâncias especialmente atenuantes existem quando se verifique a atenuação manifesta da ilicitude ou do grau de culpa da conduta em consequência dessas circunstâncias. Ademais, embora, na audiência de julgamento, B tenha efectuado a confissão parcial dos factos que lhe foram imputados, o efeito de atenuação produzido por essa confissão era muito limitado, já que os indícios da criminalidade encontrados no caso em relação a B eram bastantes e manifestos. Assim sendo, as circunstâncias invocadas por B não desencadearam a larga atenuação da ilicitude dos factos, da culpabilidade de B ou da necessidade da pena, improcedendo o recurso interposto por B.
O TSI passou a condenar os dois Réus pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, tornando-se necessária a realização da nova determinação da pena dentro da respectiva moldura penal. Destarte, acordaram no TSI em conceder provimento parcial aos recursos interpostos pelos dois Recorrentes, passando A a ser condenado, pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão, e, em cúmulo, com a pena de 4 meses de prisão aplicada pelo Tribunal a quo a A pela prática de um crime de dano, sendo o mesmo condenado na pena única de 1 ano e 2 meses de prisão. Mais, B passou a ser condenado, pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão.
Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 849/2022.