De 1999 a 2014, A era Chefe da Divisão Financeira e Patrimonial da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça. A Divisão Financeira e Patrimonial responsabilizava-se pela administração dos bens imobiliários da DSAJ, incluindo os lugares de estacionamento, alugados pela DSAJ no Edifício Administração Pública e em outros sítios, num total de cerca de 100. O trabalho da administração dos lugares de estacionamento era supervisionado pela Chefe de Divisão. Em 2010, o Departamento de Gestão Administrativa e Financeira colocou o lugar de estacionamento n.º 6 do auto-silo de China Plaza à disposição do Departamento de Reinserção Social. Mais tarde, quando o Departamento de Reinserção Social deixou de continuar a usar esse lugar de estacionamento, não avisou, por escrito, o Departamento de Gestão Administrativa e Financeira; a notificação foi feita apenas pelo condutor do Departamento de Reinserção Social à Divisão Financeira e Patrimonial, e os respectivos controlos remotos do auto-silo foram devolvidos pelo mesmo a A; entretanto, A não comunicou o caso ao seu superior hierárquico – Chefe do Departamento de Gestão Administrativa e Financeira B, e ocultou o facto de o lugar de estacionamento se encontrar vago, permitindo aos seus familiares usá-lo e falsificando o cartão de estacionamento para veículo especialmente autorizado. Em 2013, o Comissariado contra a Corrupção recebeu a queixa e iniciou a investigação e, em seguida, remeteu o processo ao Ministério Público para proceder à dedução da acusação. Posteriormente, o Tribunal Judicial de Base condenou A pela prática do “crime de abuso de poder” e do “crime de falsificação de documento de especial valor por funcionário”, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa, na sua execução, pelo período de 2 anos. Nesta conformidade, em 25 de Julho de 2018, a Secretária para Administração e Justiça proferiu despacho, apontando que a conduta de A acarretara, obviamente, influências negativas à imagem da DSAJ e, a par disso, acabara por ser condenada pelo Tribunal, levando os cidadãos a duvidar da honestidade, a nível do cumprimento de funções por parte dos funcionários públicos, e influenciando gravemente a imagem global do Governo da RAEM, pelo que decidiu aplicar a A a pena de demissão.
Inconformada, A interpôs recurso para o Tribunal de Segunda Instância, invocando que, na decisão recorrida, se verificavam o erro nos pressupostos de facto e de direito, a violação do n.º 1 do art.º 315.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau e a violação do princípio da proporcionalidade.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.
Segundo o Tribunal Colectivo, as penas de inactividade ou de aposentação compulsiva e demissão eram aplicáveis às infracções graves que, ponderadas todas as circunstâncias atendíveis, inviabilizassem a manutenção da relação funcional, ou seja, não bastava a prática de conduta constitutiva de crime que pudesse atentar contra o prestígio e dignidade da função, havia, além disso, de existir um “quid ” perturbador da relação de confiança recíproca que inviabilizasse a manutenção do vínculo profissional. O preenchimento do conceito indeterminado que correspondia à inviabilidade da manutenção da relação funcional constituiu tarefa da Administração, a concretizar mediante um juízo de prognose, assente em pressupostos, como a gravidade objectiva do facto cometido, o reflexo no exercício das funções e a personalidade do agente que se revelava inadequado para o exercício de funções públicas, factores estes que deviam ser a base da decisão administrativa, como elementos concretizadores do referido conceito indeterminado. A decisão, ora posta em crise, invocou os factos assentes que constituíam pressupostos da aplicação do n.º 1 do art.º 315.º do ETAPM, e também concluiu pela inviabilidade da manutenção da relação laboral entre a Recorrente e a Administração Pública; tendo em conta a gravidade dos factos cometidos pela Recorrente, entendeu o Tribunal Colectivo que a aplicação da pena de demissão era necessária para atingir os fins da reposição do prestígio da instituição abalado com a conduta da Recorrente, não se verificando a violação do princípio da proporcionalidade, pelo que deveria ser mantida a decisão punitiva.
Em face de todo o que ficou exposto e justificado, acordaram no TSI em negar provimento ao recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida.
Cfr. Acórdão do processo n.º 811/2018 do Tribunal de Segunda Instância.