O Comissariado contra a Corrupção (CCAC) concluiu a investigação sobre o trabalho de salvaguarda do património cultural relativo ao Restaurante Lok Kok, considerando que, desde 1991, todos os proprietários, o actual e os anteriores, do Restaurante Lok Kok não cumpriram os deveres atribuídos pela legislação de salvaguarda do património cultural da altura, o que fez com que o edifício ficasse em situação grave de mau estado de conservação e se encontrasse praticamente abandonado durante um longo período de tempo. Na altura, os serviços da área da cultura e os serviços de obras públicas não apuraram atempadamente as responsabilidades relativamente às respectivas infracções administrativas nos termos da lei, o que conduziu à extinção das responsabilidades por prescrição. Isto demostra a falta de rigorosidade na fiscalização por parte dos serviços competentes no passado. No entanto, com o reforço dos trabalhos de salvaguarda do património cultural por parte dos serviços competentes nos últimos anos e o facto de o projecto de recuperação e reconstrução do Restaurante Lok Kok se encontrar em fase de conclusão, o CCAC considera que não se vê, por enquanto, novos desafios ao trabalho de salvaguarda do património cultural em apreço. Ainda assim, é ainda necessário reforçar a criação de mecanismos internos relativos à salvaguarda do património cultural e que os diversos serviços públicos desempenhem bem as suas funções em conformidade com a nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, intensificando a comunicação e a cooperação mútuas, no sentido de colmatar eficazmente os problemas revelados no caso do Restaurante Lok Kok.
O CCAC recolheu e avaliou os processos de diversos tipos instaurados pelos serviços da área da cultura e de obras públicas respeitantes ao Restaurante Lok Kok ao longo dos 30 anos, incluindo a respectiva documentação, tendo sido analisadas também as respectivas situações de exercício de funções dos referidos serviços durante o período da vigência da nova e da antiga Lei de Salvaguarda do Património Cultural. O CCAC refere que o Instituto Cultural (IC) ou seu antecessor, ou seja, o ICM reestruturado, apenas se limitava, ao longo dos anos, ao cumprimento das suas atribuições enquanto membro da comissão de vistoria previstas no Regulamento Geral da Construção Urbana, não se viu que o mesmo serviço tinha cumprido, de forma independente e autónoma, o disposto no regime jurídico de salvaguarda do património cultural vigente da altura, não tendo o mesmo instaurado, de forma independente, um processo relativo à protecção e preservação do Restaurante Lok Kok. Este comportamento passivo da altura coloca indubitavelmente em causa o nível de empenho e a rigorosidade do cumprimento do regime jurídico de salvaguarda do património cultural por parte daquele serviço. Após a entrada em vigor da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, o IC não aplicou, no início, as sanções administrativas ao proprietário do imóvel em relação ao seu incumprimento dos deveres de salvaguarda do património cultural e de comunicação, o que conduziu à extinção das suas responsabilidades pela prática de infracções administrativas por prescrição. Quanto à responsabilidade penal, o IC efectuou um juízo técnico relativo ao desaparecimento da fachada do Restaurante Lok Kok em 2014, considerando que “a queda não ter acontecido naturalmente” e procedeu à apresentação de uma denúncia ao Ministério Público em Junho do corrente ano.
No âmbito do caso em apreço, o CCAC procedeu à análise do artigo 32.º da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, segundo o qual, a demolição de edifícios de interesse arquitectónico deve ser precedida de um trâmite conhecido como “trilogia” de procedimento, o qual inclui o parecer do IC, a auscultação do Conselho do Património Cultural e a emissão do despacho do Chefe do Executivo. O CCAC verificou que, antes de iniciar o projecto de recuperação e reconstrução, o proprietário do Restaurante Lok Kok apresentou um pedido de demolição do edifício junto da então Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), tendo o IC procedido à análise e ponderação da aplicação do artigo 32.º da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural. Uma vez que foi reconhecido que as obras de demolição e remoção solicitadas pelo proprietário envolviam apenas os restantes componentes residuais após o desabamento total da fachada, considerou-se não ser necessário iniciar o referido procedimento de “trilogia”. O CCAC considera que é compreensível a referida decisão do IC e que não se verificou qualquer ilegalidade ou irregularidade administrativa no processo acima referido.
No decorrer da investigação, o CCAC analisou ainda os trabalhos dos serviços de obras públicas no âmbito da salvaguarda do património cultural do Restaurante Lok Kok, verificando-se que, no passado, no que concerne aos bens imóveis classificados ou em vias de classificação, os serviços de obras públicas procediam ao respectivo acompanhamento e tratamento de acordo com a classificação dos edifícios gerais em risco prevista no Regulamento Geral da Construção Urbana. Após a entrada em vigor da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, não se verificou que os serviços de obras públicas tivessem cumprido efectivamente os seus poderes específicos e o poder sancionatório administrativo inerentes à demolição ilegal do bem imóvel classificado do Restaurante Lok Kok, nem que tivessem cumprido o dever de denúncia. O CCAC entende que, no trabalho de salvaguarda do património cultural do Restaurante Lok Kok, a então DSSOPT actuou de forma relativamente passiva e negativa quanto à implementação da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural.
O IC tem envidado todos os seus esforços na execução das acções governativas no âmbito da salvaguarda do património cultural, demonstrando coragem de recorrer aos meios intensos proporcionados pela nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, sendo que o projecto de recuperação e reconstrução do Restaurante Lok Kok se encontra também em fase de conclusão, pelo que não se verifica, por enquanto, novos desafios ao trabalho de salvaguarda daquele património cultural. O CCAC acredita que se os actuais serviços competentes, nomeadamente o IC, continuarem a dar importância e a cumprir efectivamente as atribuições de salvaguarda do património cultural consagradas na nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural e a empenhar-se no reforço da criação de um regime interno de salvaguarda do património cultural, e se os serviços da área da cultura e de obras públicas desempenharem bem as suas próprias funções em conformidade com a nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, intensificando a comunicação e a cooperação necessárias entre si, os problemas detectados no caso do Restaurante Lok Kok serão efectivamente colmatados.
O CCAC reconhece que os trabalhos de salvaguarda de bens imóveis, de natureza privada, classificados como sendo de interesse cultural, dependem muito da iniciativa dos seus proprietários, e que a salvaguarda do património cultural da RAEM é da responsabilidade e dever comum do Governo da RAEM, dos cidadãos, dos respectivos proprietários, detentores e gestores dos respectivos bens classificados como fazendo parte do património cultural, sendo estes não apenas responsabilidades e deveres jurídicos, mas também responsabilidades e deveres morais da população. A boa realização do trabalho de salvaguarda do património cultural de Macau depende do empenho e da participação de todos os sectores da sociedade, pelo que é necessário reforçar a comunicação e a cooperação entre todos, prestando atenção conjunta à salvaguarda do património cultural de Macau, em prol da continuidade da sua herança.
De harmonia com a Lei Orgânica do Comissariado contra a Corrupção, o CCAC já comunicou o resultado da referida investigação ao Chefe do Executivo e transmitiu as respectivas opiniões aos serviços competentes.