Em 2003, B, residente do Interior da China, casou-se com C e teve uma filha. C faleceu em 2015 por doença. Em 2016, B encontrou-se com A, residente de Macau (seu antigo colega de escola primária), tendo eles trocado números de telefone e de WeChat. Posteriormente, A e B acordaram em ajudar B a obter o Bilhete de Identidade de Residente de Macau mediante casamento falso, tendo registado o casamento em Jiangmen em 2018 e obtido a certidão de casamento. De facto, A e B não tinham vontade de contrair casamento nem de viver juntos, pretendendo apenas requerer a fixação de residência em Macau para B com fundamento na reunião conjugal. Realizado o registo, A continuou a viver em Macau e B ficou no Interior da China. Em 2019, A apresentou à Direcção dos Serviços de Identificação o requerimento de alteração do estado civil, declarando B como seu cônjuge e anexando a cópia da certidão de casamento acima referida como comprovativo da relação conjugal dos dois. Em 2022, B apresentou dois requerimentos de autorização de residência junto do Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau, pedindo a autorização de residência em Macau para si e para a sua filha, respectivamente, com fundamento na reunião conjugal e na reunião de madrasta e filha. No mesmo ano, A e B entregaram à autoridade a cópia da referida certidão de casamento e a declaração de manutenção da relação conjugal / união de facto assinada por ambos, na qual declararam que mantinham a relação matrimonial legal e coabitavam. No entanto, após a verificação dos dados de migração e uma investigação profunda, o CPSP descobriu que era falsa a relação conjugal entre os dois, tendo revelado posteriormente o caso. O Ministério Público deduziu acusação contra A e B. Após o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A e B, pela prática, na co-autoria material, de um “crime de simulação e invocação de certos actos jurídicos para obtenção de autorizações”, p. e p. pelo art.º 78.º da Lei n.º 16/2021, respectivamente, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos.
Inconformados, recorreram A e B para o Tribunal de Segunda Instância, alegando que a decisão do Tribunal a quo padecia dos vícios de erro notório na apreciação da prova e de erro na aplicação da lei.
O Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância conheceu do caso. Indicou o Tribunal Colectivo que os recorrentes apresentaram a versão dos factos relativa às provas nos autos apenas com base nas suas análises e opiniões pessoais, o que, porém, não impedia o Tribunal a quo de formar a sua convicção conforme as regras da experiência comum e o senso comum. Entendeu o Tribunal Colectivo que da análise sintética das provas resultou que os sentimentos e as relações entre os dois recorrentes eram anormais e distantes, a comunicação entre os dois se concentrava em ajudar B a obter o direito de residência, esta sensação de estranheza e distância não se coadunava com a forma de convívio dos cônjuges chineses invocada por eles, na realidade também faltava vestígio da vivência em comum dos cônjuges em geral, por isso, a convicção do Tribunal a quo não violou nenhuma regra da experiência comum ou senso comum. Quanto à alegação dos recorrentes do erro na aplicação da lei, no sentido de que as provas em causa não satisfaziam os requisitos constitutivos do crime previsto no art.º 78.º da Lei n.º 16/2021 e era violado o princípio in dubio pro reo, entendeu o Tribunal Colectivo que os recorrentes se limitavam a salientar a falta de prova directa a demonstrar o acordo de casamento falso ou a troca de interesses entre eles resultante da celebração do casamento falso, no entanto, o Tribunal a quo já deu uma fundamentação pormenorizada sobre isso, nem merecia censura a convicção, pelo que era evidente a inexistência de dúvida ou vício. Após a análise, o Tribunal Colectivo entendeu que as condutas dos dois recorrentes preencheram completamente os requisitos constitutivos do crime em causa e os factos dados como provados eram suficientes para constituir o crime imputado, não existindo margem de absolvição.
Face ao exposto, acordaram no Tribunal Colectivo do TSI em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão do Tribunal a quo.
Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância no Processo n.º 198/2025.